sábado, outubro 11, 2003

DIÁRIO - XII – MIGUEL TORGA (VI)

“Coimbra, 25 de Abril de 1975 – Eleições sérias, finalmente. E foi nestes cinquenta anos de exílio na pátria a maior consolação cívica que tive. Era comovedor ver a convicção, a compostura, o aprumo, a dignidade assumida pela multidão de eleitores a caminhar para as urnas, cada qual compenetrado de ser portador de uma riqueza preciosa e vulnerável: o seu voto, a sua opinião, a sua determinação.



S. Martinho de Anta, 28 de Junho de 1976 – Não tenho mão em mim. Trabalho excessivamente, sofro excessivamente, vivo excessivamente. Vou às do cabo em tudo, como se cada minuto fosse decisivo no meu destino. Durmo acordado, ando a galope, morro por antecipação.



Albufeira, 1 de Agosto de 1976 – Metade de Portugal atravessado, debaixo de um calor escaldante. Beira Litoral, Estremadura, Ribatejo, Alentejo e Algarve. Um microcosmo a arder em febre natural e social, esta última patenteada nos cartazes profusos, na linguagem desbragada, na freima de comícios, no lixo acumulado, nas terras por amanhar. Não há dúvida: o país não é o mesmo de há três anos. A revolução que o sacudiu, para se dar altura, teve de conferir altura ao que destruiu. A maneira que encontrou de conseguir projectar a sua imagem, foi acelerar o processo subversivo.



S. Martinho de Anta, 6 de Setembro de 1976 – O Prémio Internacional de Poesia. Deus me proteja.



Chaves, 8 de Setembro de 1976 – Exausto. Em Portugal, a glória dura um dia, quando muito. Mas chega e sobra.


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